terça-feira, 2 de dezembro de 2014

visita

deixe a porta aberta
para o caso dela querer te agarrar
- ele aconselhou

eu jamais faria isso

eu, que não sei chegar nas pessoas
eu, que tão pouco sei sair das pessoas.

convide-me um dia para ficar
para adormecer
com a luz
de hiroshima mon amour
sobre nossas caras sob cobertas

eu, que não consigo dormir junto das pessoas
eu, que tão pouco desperto-me delas

transvivo em estado onírico

e se acaso sonhares
em meu ombro
adormeço
em morte
aos céus.




sexta-feira, 7 de novembro de 2014

da arte de rasgar-se

do amor quando siamês

Ela pinta os lábios de vermelho
molha a boca em chopp e diz:
não aguento mais música-canção

Ela tem a bokaloka
estampada na camisa branca
estampada no sorriso debochado
estampada no meu pescoço em arrepio

Ela pinta, trança e engoma os cabelos
brinca com minhas mãos para que eu dance
brinca com meus fios para que eu me liberte

Não se acanha, não se abala
e veste os óculos escuros no circo voador para disfarçar
(ou para proteger-se dos caretas e covardes)

Ela veste um jeans rasgado:
"Foi a vida quem rasgou"
nunca acredito
mas passo o dedo para conferir a textura

Com a voz macia envolvente
a aquariana à frente de seu tempo
se despede desiludida:
"Não tem rasgação na música contemporânea"

Ata as madeixas louras
veste o casaco
sinaliza uma nave
e parte.




quarta-feira, 29 de outubro de 2014

leitura ao sol de um poema submerso




dentro d'água
abri os olhos
suas pernas
teus braços apoiados na borda da piscina
tubarão presa ao sol
a água turva
meus cílios firmes]o corpo livre em água
voando para teu corpo
te contorno
mas sem toque
nossas coxas
por frente
barrigas
emergi
frente a você
seus olhos secos
minha cara molhada
o sol
reflexo teu
por baixo
te lambi
teus braços
saí


facebook.com/mulheresabeira

quinta-feira, 21 de agosto de 2014

boa tarde

dois cachorros vizinhos
latem
querem fazer amizade
nesta tarde
de céu azul
compartilham solidão
nunca se conhecerão
nada faço
tudo ouço
e meu peito de bicho arde
boa tarde
filme a espuma dos dias

domingo, 10 de agosto de 2014

a garota aquariana - I

Ella está digitando...
"
Vc = uma gota rara deslizando nos meus impetos mais impulsivos.
Eu= uma pessoa sem limites
                                            "

segunda-feira, 14 de julho de 2014

da noite em que oxóssi encontrou yemanjá

lua cheia
de ponta cabeça
somente se via

iluminava
todo
o corpo dela
a cara dele

pendido o pescoço
suspensa as pernas
patas cheias de saliva

pedidos e ordens
supervisionados
servir-se e sorver

perdidos os sentidos
controle e vontade
mata selvagem de prazer

caçar sem pudor
caça ser em louvor
corpo um só

banho de terra
banho de mar
autorretrato luna llena
cavar e espumar
espumar
espumar


domingo, 29 de junho de 2014

cozinho

cozinhando quinoa
com a bunda de fora
adiar banho
fazer comida
para nada disso
é certa a hora

terça-feira, 27 de maio de 2014

boletim médico

quarto banho do dia
falta uma hora para nova dose
o corpo arrepiando
pelos e peitos
rechaza a água fria
não há outra opção
molha o corpo
tapa os mamilos com as mãos
em vão
nota a unha do pé esquerdo perdendo a cor
molha os cabelos
todo o seu corpo treme
o roxo da toalha colore o rosto
os olhos fundos
os lábios inhame
desliza até o chão e nele fica
mentalmente
fisicamente se arrasta
até a cama
fecha os olhos
sonha
e começa a suar outra vez


                                                                                                                                          março de 2013










sábado, 24 de maio de 2014

bang bang little boy

bang bang 
toquei a campainha 
bang bang 
minha boca tocou o copo
 bang bang 
suas mãos tocaram meus pés 

 num instante nem podia supor 
nem ousara por vez em sonho sonhar 
mas meus lábios tocaram os seus 
na infância da praia não vivida 
sua prancha de isopor desmoronara o castelo meu
 minha camiseta branca molhada 
suor e água salgada 
meu biquíni com areia 
eu tinha apenas seis anos 
sua prancha de isopor com seu corpo por cima 
meu choro 
a rebeldia em você 
a rebeldia dos seus onze anos



sexta-feira, 9 de maio de 2014

você pode ouvir os cavalos?

publicado em 26 de setembro de 2013 no site tremaliteratura.com


que vento
que venta
e entra
pela janela
passa pelos meus cabelos
presos no alto
a camiseta fina
arrepia o pescoço
poderia ser ficção
mas não
vento fresco
preciso levantar
fechar janela
ouço as árvores balançando
a natureza está viva
ouço
não sei se chuva ou vento
ainda não me levantei
escrevo
florence ao fundo
não compreendo nada
mas me diz algo
"eu te amo brasil"
em inglês
dog days are over
plateia vibra
procuro
sim, essa música
minha irmã um dia me mostrou o clipe
que sensação
eles cantam
canta o vento
cato minha alma
recolhida
elevo-a para dançar
chove
parece verão
esmalte descasca
conheci um lindo jardim hoje nessa rua
seu venceslau
a casa que fora de sua mãe
ele transformou num imenso secreto infinito
discreto
cria piranhas que brilham
seus olhos também, d'água
ao falar de sua esposa
que já morreu
em homenagem o nome num jardim
e uma placa com uma trova
para maria das graças
graça de lau atendida
ele a leu num encontro de trovadores
teresópolis
disfarço minhas lágrimas
não tenho direito
e seu jardim de peixes tão cotidianamente escondido de nossos olhos
afoitos
"caminhe mais devagar, aline"
sem pressa podemos comungar com o belo
voltarei para conhecer o terraço de preciosidades
vento leva meus sinais
fecho os olhos
imagino-o arrepiando-te também
para onde irei?
sozinha
te espero
em prece
chove fino pela janela
"mato-grosso é um peixe amoroso, estão sempre juntos"
"essas plantas fecham as mãos assim, de noite"
chove.




nota do editor: Aline Miranda tem estado tão feliz que 
o Dalai anda se inspirando nela para seu próximo livro

quarta-feira, 7 de maio de 2014

azul

a casa
o jardim
céu de estrelas sobre mim

sou azul
tão azul
vaga-lume
louva-deus
louva meus eus

(é uma musiquinha mas não tive coragem
 de compartilhar cantando)

segunda-feira, 28 de abril de 2014

coisas tão malucas

(cada verso o nome de uma canção do falo de coração)


flor de tudo
morfina
seven laughs
parede cinza

e se a vida for
o amor uma frase por vez
leal
eu não vou chorar por fora

meu seu
sol de meio-dia
eu parti



https://soundcloud.com/bolachadiscos/sets/lucas-vasconcellos-falo-de

flor da idade

o alvo
o arco
a flecha

revesa

domingo no parque

uva e limão 
nossos preferidos
chupamos sem fim

vocês são artistas?
indagou o vendedor 
sorrimos: talvez

aterro do flamengo
domingo de sol
aos três

(des)ilusão

"você é perigosa, aline"
mas foram sempre eles que me tiveram em suas mãos.

quinta-feira, 24 de abril de 2014

à menina

houve uma noite
o pequeno corpo dela
sobre o meu

afaguei-lhe cabelos
- vou acabar dormindo
- será um prazer

adormecemos
pulmões colados
ou seria sua boca sobre os meus

aquele rio de janeiro
como um filme
que meus olhos teimam em narrar

oração ao homem que eu amei

praia das conchas - cabo frio

seria eu?

menina: desculpe, eu pensei que pudesse dizer tudo.

professora de teatro: não sei o porquê mas vou lhe dizer isso pois um dia fará sentido para você. daqui há algum tempo você se olhará e dirá: "mas eu sou essa pessoa". e nesta afirmação tão certeira haverá uma espécie de amor.
menina: eu estou com medo.
professora: todos nós estamos.

do filme "a menina no país das maravilhas"





terça-feira, 8 de abril de 2014

das deusas L e M (trechos)

fui devota do altar cujo pedestal me era mais próximo, cujo santo eu podia tocar com consentimento, sem disfarces. lucíola era uma deusa _ _ _ _ _ _ _ ora. só perdia em devoção minha para m., a _ _ _ _ora. sou epitelial. mas com lucíola eu precisava da desculpa do toque. cumprimentos de chegada e despedida. mesa de bar: lê minha mão? 
(...)
lucíola, minha _ _ _ _ _ _ _ora deusa. só não mais que você. pois abandonei-a em último dia para ir ao encontro teu, para atender ao chamado teu. o chamado de nossos corpos... que há 24 horas ansiavam pelo encontro: chega mais cedo, a gente toma um vinho, dá uns beijos. o teatro com piano, minha blusa com renda, minha felicidade e rubor pelo teu olhar admirado, a sutil e momentânea inversão de papéis, adorador e adorado. luz no altar. teu eu apoio ao meu, ao lado. euseiquevout. o chamado de nossos corpos que não queriam despedir-se após o bar. tom jobim compôs aqui a garota de ipanema. previsões.
(...)
nos despedimos sem conseguir dizer o que olhos buscavam em bocas mudas.
(...)
eu precisava do seu tão logo escrever, para assegurar-me não delirar sozinha. se tivesses me chamado eu iria. eu sempre iria. eu sempre fui. como fui ao seguinte dia. os corpos não se contentavam com o fón. eram curiosos, corajosos, desbravadores. não estou com clima para festa, metaforizei. você entendeu e ofereceu-me um prato de comida quente. chantageou-me com poema meu. trancei-lhe enfim os cabelos. bonita. levei um filme. não vimos. eu quis deixar ligado na canção-tema. você prefere a realidade dos sons naturais dos corpos, de dentro e de fora.
(...)
a foto que não tirei. o celular que piscava fraca bateria. ainda tenho a imagem em mente, feito sonho antigo. se me concentro, vem: o sofá, a luz do sol descendo rápido escurecendo a mata pela janela, seus pés, a perna dobrada, joelhos para cima, colado à barriga (tão linda, a mais linda que houvera, a pinta prima da minha), aos peitos (tão lindos, os mais lindos que houvera, a surpresa minha), seu corpo sentado ao meu lado, o retrato que meu olhar fazia. as mãos ao pequeno instrumento, a minha música preferida, sua tradução a cada verso, que eu já procurara e sabia, mas não consegui ou quis dizer, você dedicada e leve, o vestido, os dedos, os raios suaves, a voz, o picolé na pracinha, a tua fã de cabelo colorido, uva e limão, nossos preferidos, vocês são artistas?, o vendedor disse uma vez, no aterro, num domingo, aos três.
(...)
lucíola, minha _ _ _ _ _ _ _ora deusa. só não mais que você. pois que faltei-lhe o último dia para ir ao encontro teu. naquela quarta-feira em que juntas entardecemos. posso ficar aqui dentro pra sempre?, perguntei. você riu.

quarta-feira, 19 de março de 2014

vivelís [cada verso, um título de música]

nós e o mar
mania de gostar

madalena
me deixas louca
aprendendo a jogar

atrás da porta
essa mulher
dois pra lá dois pra cá

sem teu amor
noves fora
silêncio
sabiá

preciso aprender a ser só
mestre dos mares
vou deitar e rolar

se eu quiser falar com deus
deixa o mundo e o sol entrar

sá marina
outros cais
querelas do brasil

o barquinho
arrastão
boa noite amor

chovendo na roseira
é com esse que eu vou

bicho do mato
upa neguinho
garoto último tipo

baila comigo
samba da benção
20 anos blues

alô saudade
ladeira da preguiça
o bêbado e a equilibrista

o trem azul
se você pensa
nada será como antes

deixa.

feliz elisversário 

terça-feira, 18 de março de 2014

segunda-feira, 17 de março de 2014

eu queria ter escrito esse poema

Esse impacto
violentamente
carinhoso
de nossos quadris
delicadamente
selvagens
afoga
instintivamente
minha razão.

Benoit Manjour - Dias de Madrugadas

sexta-feira, 14 de março de 2014

encontrado entre apuntes de clases rosarinas

I
se me quedo sin amor
(no el sentimento, pero la práctica)
de pronto el olor
de la química de tu pelo
invade mis narinas
provocando reaciones por todo el cuerpo
adentro
afuera
en el alma
y en los sueños.

II
me duele
tu ausencia
los cariños
ahora lejos
q'antes hacíamos juntas
tus palabras eran las mías
cómo vivir sin la mirada tuya?

18/11/13
facultad libre
rosario, argentina

quinta-feira, 13 de março de 2014

melanco-melodín

cuando partistes
sin avisar que mis dias serán grises
los colores huíran de mi cuerpo
i boca seca no hay agua que la pueda arreglar

(cantarolando de improviso ao violão 
que não sei tocar
e sinto que o verbo "serán" está errado
mas não sei conjugar)

do amor

parece tão simples
mas que difícil é calhar
assim
o amor
essa gangorra


sábado, 8 de março de 2014

des-pé-rtar

mindinho
trrr
vizinho
...
trrr
...
dedão

um por um estalados
os dedos dos pés
pela mão

as tão grandes patas
as veias rios que correm
tantos dedos
unhas
pescam
pagãs
puxam

os dedos tão pequenos
os pés sempre chorosos
uns os diziam feios
outros diziam horrorosos

trrr
trrr's
agora no esquerdo
os dedos sorriam
adormecidos
davam gritinhos
surdos
os pés gemiam

(sentia certo nervosismo
desde criança
mais que dor, é verdade
estalo de cuidado e intimidade
- por carinho é até bom sofrer)

quinta-feira, 27 de fevereiro de 2014

confissões de adolescentes - episódo de hoje: el cuerpo

as noites podem ser bem doloridas às vezes, ainda que a dor não seja física, ainda que a dor não-física escorra também  pelo corpo. os olhos podem amanhecer fugindo da luz, a voz pode faltar, pode faltar também o ar. mas a roda do mundo gira e cada passo caminhado em cima do globo o faz girar também. sem movimento, morre-se. as palavras tem poder. de punhal e de cura.
tpm às vezes passa sem se notar. o corpo geralmente se faz perceber. é importante que a mulher, que o ser humano, perceba e respeite os sinais de seu corpo.

djavan toca na rádio: sorrir quando a dor te torturar e a saudade atormentar os teus dias tristonhos vazios.

a menina conversava - internet e seu poder de aproximar mesmo que se esteja longe-, agachou-se no chão da cozinha enquanto passava um café de almoço. o chão quadriculado. branco e preto. o pano fino do vestido azul. chorou, riu, nem sentia mais as cólicas da manhã, no ventre, no coração pesado. as palavras dela foram entrando, feito mantra, feito manto, feito alma, e o bálsamo, aos poucos, foi tomando-lhe os lábios, o pranto fez-se riso e o pulmão respirou fundo os novos ares e o aroma quente e acolhedor do café. despediram-se virtualmente. ela pensava na pesquisa. pensava no poder das palavras. nas decepções. nos afetos que se transformam. nas ligações importantes. 

mpb4 toca na rádio: eu já estou com o pé nessa estrada, qualquer dia a gente se vê, sei que nada será como antes, amanhã, que notícias me dão dos amigos? que notícias me dão de você? alvoroço em meu coração, amanhã ou depois de amanhã resistindo na boca da noite um gosto de sol.

a menina se levanta, leve, agora já sente fome. percebe-se com leve dor, percebe: menstruou. o sangue correndo pela conversa, pelo passado, pelo presente, pelos corpos, pelas terras todas, lavando e levando todos os fantasmas que ainda podiam sobreviver agarrados à pele, internos. a cor mais quente, as unhas cor vanguarda, quente o rio que não corre duas vezes no mesmo lugar.

quarta-feira, 26 de fevereiro de 2014

dos signos e dos significados

No banheiro a menina espirra
Dizem que taurino sempre espirra mais de uma vez seguida
Haverá muitas diferenças entre tauro y taura?
A menina espirra
O menino esporra
Que nojo! dirão
É corpo.
A água escorre no corpo da menina
Os poros se abrem
Enquanto no quarto a música abafa o som do ventilador
É verão
A menina se banha
Eu sonho.

terça-feira, 25 de fevereiro de 2014

del boludo chico

me llenaba
de cariño 
y de ternura 
y de dulces

los pondría 
en mi cuerpo 
adentro 
con ganas

terça-feira, 18 de fevereiro de 2014

da companhia - III

minha alma gosta do toque do corpo
mas meu corpo gosta do toque da alma

dentro de mim o desejo é expansão
mas meu corpo fecha-se em fim

a mulher que em mim habita quer romper-se
mas ela habita um corpo covarde

ela não sabe ainda disso
por isso me faz suar
me faz chorar
estremecer

ela não é ingênua
é rude
mas habita minha timidez
minha falta de jeito
minha pouca lembrança

alma alienígena ano 3015 em marte
corpo terreno
terráquio
esquálido
sem arte
sem arde.

segunda-feira, 17 de fevereiro de 2014

sobre vanessa e todas nós






Uma amiga se feriu.

Ela não caiu de bicicleta, não tropeçou, não escorregou, não estava se arriscando de skyte, de altura, nada.

Ela foi ferida. por existir.

Sei que soa forte, soa exagero, mas infelizmente não é. E todas nós, suas amigas, estamos nos sentindo assim, machucadas, abandonadas, desprotegidas.

Sem poder contar com o Estado, e pior, com os seres humanos, outros, que viram e nada fizeram.

Para a sociedade não somos todos iguais. Nem para o guarda do teatro que não manifestou ajuda. Nem para o taxista que se recusou a levá-las porque a lapa era muito perto da praça tiradentes, ele faturaria pouco. Vivemos nessa sociedade suja onde 30 reais valem mais que a compaixão, o amor, a solidariedade.

E não dizem que não se bate em uma flor?

Vanessa é uma flor, é pequena e delicada, pacífica.

Ainda que fosse um cacto, o que leva alguém a agredir uma menina por ela estar de mão dada com sua mulher? O que leva alguém a se achar no direito de?

Eu já venho conversando com muita gente sobre a violência cotidiana que nós mulheres sofremos nas ruas, no trabalho. Há algumas semanas me senti violentada verbalmente por um homem, quando voltava para casa de noite com uma amiga. Ainda que eu racionalmente saiba que não tenho culpa alguma quanto ao comportamento abominável desse(s) sujeito(s), senti-me constrangida por ela ter presenciado tal cena. Eu ainda disse: por isso não costumo sair com vestidos assim, um pouco mais justos. E mesmo que ela dissesse que eu não deveria mudar meu comportamento, que o antissocial era ele, quererei eu passar de novo por tal situação?

Até que uma amiga é agredida fisicamente.

Por que nós mulheres, em pleno 2014, ainda somos vistas como objetos, carne, inferiores? Por que os homens, em pleno 2014, ainda se acham no direito (e quase obrigação) de exteriorizar verbalmente o que imaginam quando vêem nossos corpos? Ou eles acham que também não temos imaginação com peitos, paus, bundas, bocas? O que leva um ser humano a invadir o outro com gestos e palavras? A não respeitá-lo como igual? Não pensam que tal situação poderia ocorrer com sua filha, esposa ou mãe? Nem assim? O que leva um ser humano a pensar friamente: “olha aquele casal de lésbicas, vamos lá...”? O que o amor pode ter de tão agressivo que atinja um desconhecido assim? Que criação machista é essa que dão aos pequenos meninos para se transformarem em grandes monstros?

Infelizmente, a maioria das minhas amigas já passou ou presenciou algum abuso de teor sexual durante a vida. Isso é um absurdo. Isso é velado. E quando se fala, é criticada. Poucos desses relatos tiveram apoio de quem o escutou. Por sorte nunca passei grande constrangimento. Mas confesso que demorei muito a me sentir à vontade de biquíni na praia, por exemplo. Tenho eu culpa do corpo que habito? Temos nós culpas do amor que sentimos? Sei que não. Mas dói. E por mais esclarecido e sensível que um homem possa ser, ele não é capaz de imaginar o constrangimento que causa uma palavra suja, uma atitude ofensiva. Um homem não sobe a ladeira de sua casa e, já receoso, ao passar por um grupo de mulheres segurando cervejas leva um susto com uma que passa e grita ao seu lado. Nenhum homem, nem com sua calça de yoga, descerá até a praça e ouvirá uma mulher dizê-lo: “que vontade de chupar esse pau gostoso” (ou coisa pior que não gosto de reproduzir). Nenhum homem, passando em pé na bicicleta, receberá um tapa na bunda, com 11 anos, uma criança. Nenhum homem caminhando, também criança, com seu amigo terá seu pau apertado por uma mulher adulta que passa rápido de bicicleta. Nenhum homem, jovem, receberá uma ligação em sua casa dizendo: “você é o filho mais novo ou mais velho de Fulana? Então calma aí que estou gozando”. É pseudo cômico quando imaginamos a situação ao contrário, tamanha naturalização ela se dá na relação homem –> mulher. Mas todos esses fatos aconteceram, comigo ou com amigas. O caso da homofobia segue esse mesmo pensamento machista: você existe mulher, você existe lésbica, merece apanhar, ser apalpada, ouvir meus desejos. Por quê?

Uma amiga professora conversou com um aluno que estava dizendo que queria “bater naqueles viadinhos que entraram na escola”. Ela tentou explicar que os meninos não lhe faziam mal algum e que, mesmo assim, ninguém pode agredir. Ele só respondeu “eles são gays, TEM QUE apanhar”.

Vi dois vídeos essa semana por acaso, via facebook, que retratam talvez a melhor maneira de aclarar a gravidade dessas situações, que nos dias de hoje não deveriam AINDA existir. Os vídeos tratam de machismo e homofobia fazendo a inversão de papéis: num mundo onde a maioria é homossexual e uma menina se descobre heterossexual e sofre com amigos de escola e família ao ponto de..; e outro onde um homem sofre abusos verbais e físicos na rua enquanto as mulheres passam sem camisa, torcem o pescoço ao vê-lo passar, e são a maioria ao atendê-lo na “delegacia do homem”.

Numa semana onde duas garotas são quase presas após chamarem a ridícula “lapa presente” (“de grego”, alguém disse bem) para defendê-las de um agressor em frente ao bar da cachaça, recebendo pouquíssimo apoio dos que estavam perto, de amigas sofrerem tal violência física por nada e também se sentirem sozinhas sem ajuda alguma.... Como continuaremos a viver? Como continuarão a viver? Teremos que seguir a cartilha da Folha, sem “dar pinta”, teremos que nos trancar em casa? Usarmos burca, talvez? Que Lapa é essa? Que Cidade Maravilhosa é essa? Que sociedade de merda é essa em que calhamos de estar vivendo agora? Azar o nosso?

E eu que jurava que a abertura sobre a temática homossexual estava trazendo esclarecimento e respeito à população, percebo que ela traz consigo também uma violência cada vez maior e menos escondida. E o que, afinal, fariam os guardas do “lapa presente”, ou o segurança do teatro João Caetano, ou o taxista? Eles não acham que é errado, pois COM CERTEZA fazem o mesmo quando vêem uma mulher ou um casal gay nas ruas.

Lembro que minha mãe, quando eu era criança, me dizia que tínhamos que arrumar sempre a cama, caso contrário nosso anjo da guarda não acordaria e nos acompanharia durante o dia. Domingo ao acordar, li a mensagem de Vanessa. Demorei para entender que era dura a verdade. Vanessa e Lady são vizinhas do prédio onde moramos muitos amigos. Fui vê-las, e na pressa, percebi que minha cama ficara desfeita. Olhei para trás, e chorando, deixei. Percebi que não há anjo da guarda algum.







“É preciso estar atento e forte, não temos tempo de temer a morte”.

É triste, é verdade.




p.s: na mesma noite, sem saber ainda do ocorrido, saía do Leblon com um casal de amigas gays, e do outro lado da rua, um homem disse algo, olhamos só mais longe e ele estava bufando como um touro, em posição de ataque, literalmente como um animal. nojo.




p.p.s.: passadas 24h, após conversas, diálogos, visitas, percebi que talvez o anjo da guarda das meninas estava no único rapaz que foi em direção a elas ajudá-las, fazendo com que os covardes animais fugissem. se não fosse ele, o que seria...? nem pensemos.

percebi também que é importante não generalizar. ontem conversei com um taxista e ele me contou que na noite anterior duas meninas haviam sido assaltadas e ele as levou até uma delegacia, gratuitamente. ainda há humanos nesse zoológico dos horrores, amém.







o relato de Vanessa Holanda:

"ontem, voltando de um bloco de carnaval aqui no RJ, 2 homens me derrubaram no chão, me arrastaram no asfalto, me chutaram, rasgaram minha calcinha, arrancaram meu top e me deixaram quase nua na calçada do centro da cidade. o lugar não estava vazio. tinha gente, muita. tinha segurança, sim. era um lugar iluminado.

o meu corpo é pequeno, não precisa de muito chute pra deixar ele completamente tremido. mas eu não vou a polícia. não vou pq eles também não se importam. não vou fazer exame de corpo de delito, nem na delegacia, nem no médico. eles estão do outro lado, amigos. ontem a noite eu me senti minoria. e que ninguém além dos meus pode ser comigo. nós estamos sós. não dói.”




O relato de Leidiane Carvalho:

“Vanessa Holanda é minha mulher. Estávamos juntas na hora dessa agressão. Ontem sofremos muitos atos de violência. Não só dos caras que nos atacaram, mas do segurança do Teatro João Caetano que não nos ajudou, das pessoas todas que estavam em volta e se omitiram, apenas olharam enquanto apanhávamos, do taxista que se negou a nos levar em casa porque a corrida daria menos que dez reais. Um rapaz foi o único a vir nos defender e se não fosse ele não sei o que teria acontecido. Queria muito saber o nome dele pra agradecer mais uma vez e saber direito o que ele viu, porque depois de uma violência tão grande a memória nos trai. Quero agradecer as muitas mensagens de solidariedade e orientações sobre como proceder e denunciar. Queremos lutar e reagir, agradecemos muito a todos que tem se manifestado mostrando que estão disponíveis pra o que precisarmos. Vamos encontrar os meios certos de fazer a denúncia com sua ajuda. E força pra todos nós.”







sexta-feira, 14 de fevereiro de 2014

via reiki

um dia teremos tempo e farei tranças em todo seu cabelo enquanto sonhas

um dia teremos tempo e leremos juntas todos seus amarelados livros de velho oeste naquela praia tranquila

um dia teremos tempo e beberemos vinho no sítio e nos beijaremos e de noite cairemos nus na piscina após ler poesia

um dia teremos tempo e farás barquinhos de papel que do barco lançaremos ao mar sorridentes

um dia teremos tempo e escreverei poemas em teu corpo esguio

um dia teremos tempo e deitaremos sobre a grama após o sexo para me mostrares as estrelas como deve ser feito segundo aquele livro

um dia teremos tempo e dançaremos todas as canções dos bailes de outrora, corpos colados, meus pés sobre os seus

um dia teremos tempo e depositarei em seus chakras as pedrinhas coloridas que comprei na viagem

um dia teremos tempo e leremos toda a coleção das tirinhas da aline que teremos comprado

um dia teremos tempo e iremos para sua casa em búzios para escrever e eu te olhando, boiarmos no azul

um dia teremos
um dia
esse tempo

quem sabe em outra vida?

quinta-feira, 13 de fevereiro de 2014

da companhia - II


tem uma mulher que ri e que chora dentro de mim 
eu não a deixo sair 
e me dói fisicamente toda a sua angústia

deito e suo 
durmo e oro 
choro em sonho 
imploro

ela não se vai 
não se esvai 
e me sussurra 
só partir 
em gozo.


quarta-feira, 12 de fevereiro de 2014

da companhia

você que não conheço
que me invade sonhos
e levas minha mão a tocar-te

você que não tem sexo
que me desperta aflita
sem ao lado meu pousar

você que é todos os sexos
que povoa minha mente desperta
trazendo frescor aos dias de verão

você que não nasceu
que não tem corpo ou massa
mas faz-te presente em mim.

rabo de peixe

a conversa durou o mesmo tempo dos gelos
no calor do copo de mate
limão

nem o súbito vento fora capaz de varrer
as migalhas ainda frescas
do passado

segunda-feira, 3 de fevereiro de 2014

aham cláudia

peço desculpas agora que sei que há quem receba atualizações daqui por email mas é um mantra que precisa ser escrito:

"última encarnação" é o olho do teu cu.


ommmmmmmmmmmmmmmmm
ommmmmmmmmmmmmmmmmmmmmmmmmmmm
ommmmmmmmmmmmmmmmmmmmmmmmmmmmmmmmmmm

gracias.

uma aprendizagem ou o sonho dos prazeres

1- Ver um hamster em seu sonho representa emoções reprimidas.
Você está se distanciando das pessoas para não se magoar.
Também pode significar sua postura frente à sexualidade. 
Você consegue separar sexo e amor.


Moça, mas tem daquele ratinho que parece ter corpo de cavalo?

2 - Cavalo: o cavalo é o símbolo da força e da paixão.

quarta-feira, 29 de janeiro de 2014

a máquina de escrever sonhos


atualização enviada, obrigada internet, pela nova amiga, hétero curiosa, que distante tentava secar, com certo sucesso, gracias, essas chuvas tempestivas de verão carioca, que datilografei ao final da folha 
en rojo: 
aline los hombres no conocen la dignidad

terça-feira, 28 de janeiro de 2014

o que não tem certeza nem nunca terá

um dia
um dia
um dia
me diz tô com saudade
viagem
viagem
digo tenho saudade
viagem
viagem
vamos fazer tal coisa
um dia
um dia
mergulho entre palavras
verdades
verdades
de esperar sentada
agonia
agonia
pescoço fica duro
me bate
me bate
os olhos ficam mudos
me arde
me arde
a noite escuto uivos
me late
me late
será que é covardia?
um dia
um dia
de esperar deitada
me afogo
me afogo
em outras alegrias
rebeldia
rebeldia
pra esconder a parte
que lhe cabe
que lhe cabe
quarto, sala, cozinha.



(Está na natureza
Será, que será?
O que não tem certeza nem nunca terá
O que não tem conserto nem nunca terá
O que não tem tamanho.

terça-feira, 21 de janeiro de 2014

d'um futuro vizinho - 3

você surge,
na janela
na cozinha,
faço café: hola
duas canecas na mesa
tenho visita, eu digo
você sorri
beijo seu rosto: você é tão bonito
entra
teu corpo sentando à mesa: posso?
sempre. imagina.
sento no seu colo
te cheiro
cheira o café
cheira o pescoço
você diz que vai fazer uma comida
convida
posso levar ela?
sempre. imagina.
levanto
deixo uma caneca pra você na mesa
você pega e sai: muá
pego duas e vou pro quarto: muá
anoitece.



segunda-feira, 20 de janeiro de 2014

d'um futuro 2 - os vizinhos

ia bater na sua porta e dizer: hey!
você abria, quase nu, tava na rede, violão
e esse cigarro? eu diria
você ria: é a vida
te levava fruta pequena: quer?
dá.
eu prendia entre os dentes.
você ria e vinha: tarada!
a língua tenta apanhar
eu fujo
corro: bora pro rio?
agora.
nu?
nus.

domingo, 19 de janeiro de 2014

d'um futuro

um dia, um dia
quero morar em caraíva
na bahia
o rio na frente
o mar atrás
ruas de areia
e numa casa amarelinha
ser sua vizinha.
foto de internet d'um lugar qu'inda não fui

segunda-feira, 6 de janeiro de 2014

cuido do meu jardim


Cuido das flores, do verde da varanda, do mato.
Gosto do mato também. Um tem pontas de flocos brancos feito espiga.
Não tiro.
Não é afinal tudo vivo?
Não é uma loucura linda dizer que planta é um ser vivo?
Me soa quase equívoco.
Vivo para mim é sinônimo de animal.
Vegetal animal.
Perco gerações cuidando das plantas.
Ganho.
Às vezes é preciso cortar os galhos secos finos, para que vejamos melhor as cores.
Para que as flores que ainda resistem à seca dos olhos de deus possam ser a memória “viva” de que há muito por brotar.
Precisamos dar motivos para deus chorar.
Corto as plantas e me sopram esses versos.
Elas.
Como gratidão.
Molho meus olhos.
Elas precisam dos olhos de deus.
Meus dedos alguns negros da terra umedecida.
Distraída cortei um ramo de pequenas flores amarelas.
Pecado original.
Eva, a jardineira fiel.
Se eu fosse flor, de certo seria amarela.
Uma amiga escreveu certa vez.
É preciso doação.
É preciso olhar além.
Viver presente.
Zelar, manter, molhar, tocar, adubar, ver crescer.
Enquanto o azul do céu teu não lhes goza,
Serena adoro.
Cuido do meu jardim como cuido de você.
essa beleza aqui: http://www.youtube.com/watch?v=gw8HuqP9XjA
res ins pirou-me, sumandose a eso un poco: http://www.youtube.com/watch?v=zsKQ2E0Sk6A
y colei uns versos acrescentando míos para chegar enfim.
é um experimento que retomei, não roubem minha ideia.



Eu entro em cena. Me sinto tão pequena perto de você com seu cabelo enroladinho.
Todos os encantos vejo em você.
Aplausos.
Eu me vejo tão bonita em você.
Chego na cidade.
Coração suado. Da tempestade do seu céu azul dos olhos seus.
Um amor de vento pra secar.
As luzes da cidade acesa clareando a foto na carteira.
Essa nova bossa.
E o tempo é outro, outro o lugar, outra a afinação.
Os tigres brancos, a vida carnaval, a razão nenhuma.
O teu jeito que é só eu de por a blusa.
Sou mar.
Somar.
No canto para acalmar a dor morena.
Eu quis te conhecer.
Deitar, cobrir a culpa, ficar sobre você, no abrigo do teu sorriso.
Pra te encantar
Voando.
Caminhamos em linhas tortas, abrimos janelas, atrevidos.
Nada é em vão.
Eu entendo seu depois. Eu aprendo. Quem ensina? Me leva?
Corre que eu te encontro.

do regresso

lista dos pequenos prazeres e estranhezas do retorno ao lar passados 3 meses:

- ao redor nada mudou
- ser recebida por uma barata mal educada no portão de casa que nem se afasta com a forte pisada ao lado
- ouvir música brasileira no rádio do táxi
- tomar banho até a ponta dos dedos enrugarem
- dormir nua
- pensar que comerá pão de queijo, arroz mil grãos, açaí e MATE gelado
- abraços e beijos y.

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